17 de julho de 2017

A Tomada da Bastilha e a Revolução de 1789 (parte I).


    Há dias, noutra plataforma, assinalei mais um aniversário sobre o 14 de Julho, dia nacional em França, feriado, e data de relevo por todo o mundo ocidental. Vindo ao blogue, reparei que jamais havia dedicado uma publicação à Revolução Francesa. Abordei-a pontualmente, a propósito de outros temas. Nove anos parece-me demasiado tempo omitindo um facto histórico de tamanha projecção, com repercussões na história de Portugal, inclusive. Por questões logísticas, e porque a matéria exigiria um aprofundamento que não se coaduna com um blogue, dividirei o artigo - num inédito - em duas publicações. Na actual, tratarei do contexto social e político em França nas vésperas da Revolução; num segundo, focar-me-ei na Revolução em si até à primeira Lei Fundamental, a Constituição de 1791. Não irei além, à queda de Napoleão - o que certos autores consideram ser o fim da Revolução - porque envolveria um esforço que me parece desajustado e excessivo.


    Vivia-se um período de profunda convulsão social em França, agravado pelo descontentamento com os impostos e pelas débeis finanças. No aspecto político, o país apresentava as seguintes características: a Corte, em primeiro lugar, onde se encontrava a nobreza; os parlements, uma espécie de tribunais; uma administração central representada pelos intendentes dos departamentos; uma colossal dívida pública e uma carga fiscal avassaladora. No alvor do Estado absolutista, a Coroa procurou diminuir o poder da grande nobreza, transferindo-o para Versailles, bem como às funções fulcrais do Estado. Todavia, os nobres não viram com bons olhos esta diminuição da sua influência. Procuraram impor-se, sobretudo por via dos ditos parlements, que não eram verdadeiros parlamentos, no sentido de assembleias legislativas, que desde o dealbar do século XVII não haviam sido convocadas, mas eram, sim, tribunais regionais que, a par de administrar a justiça, zelavam pela ordem e tranquilidade públicas em uníssono com as ordenanças reais. Estes parlamentos, que existiam em todas as circunscrições, sendo que o de Paris sobressaía, eram liderados pelos nobres, que exigiam aos seus membros um diploma de jurisprudência superior. Digamos que seria um género de nobreza de toga.  Dada a existência destes órgãos compostos por uma elite versada em Direito, nobreza e terceiro estado tinham ao seu dispor um meio, porém desigual, que lhes permitia condicionar o poder do rei e dos seus validos.

     A administração regional, que estava subordinada à Coroa, com um intendente à frente, tinha um exercício nobilitado. A nobreza gozava praticamente de isenção de impostos. A maior parcela das contribuições vinha dos agricultores, dos artesãos e dos comerciantes, que, contudo, era insuficiente para cobrir as despesas do Estado. Das receitas obtidas, uma boa parte era destinada a amortecer a dívida e os seus juros, enquanto que a remanescente era utilizada para financiar os frequentes conflitos bélicos. Os ministros do rei, Turgot (de 1744 a 1766), Necker (1777 a 1781) e Calonne, derradeiramente, foram alvos permanentes dos parlamentos da aristocracia e da nobreza de toga. Os dois primeiros tiveram pouca sorte no desempenho das suas funções governativas. Calonne, entretanto, propôs um amplo programa de reformas, o que já Turgot propusera, nomeadamente tornar a administração menos burocrática, abolir os privilégios tributários, nivelar os impostos entre as camadas da população e incentivar a produção. Adivinhando a oposição dos parlamentos, Calonne decidiu submeter o seu vasto programa à aprovação dos Estados Gerais, que não reuniam desde 1614. Por escassez de tempo e porque era necessário agir depressa dada a multiplicação da dívida pública pelos esforços de guerra, convocou-se uma assembleia de notáveis em 1787. Esta assembleia, composta pela nobreza e por alguns membros do terceiro estado, ainda que de início se mostrasse disposta a aceitar alguns pontos da reforma, depressa se declarou incompetente. Calonne viu-se afastado e tudo equivaleu a uma derrota política do monarca, Luís XVI, rei desde 1774, e de toda a sua corte.

     A situação agudizou-se. O rei, reagindo, ordenou prisões e desterros, e a 17 de Maio de 1788 cerceou o poder dos parlamentos. Difundiu-se, pelo reino, uma agitação contra o monarca e a sua corte. De Maio de 1788 a Setembro,  surgiram centenas de libelos a atacar as decisões despóticas de Luís XVI. Houve confrontos nas províncias. Os parlamentos provinciais  exigiram a convocação célere de Estados Gerais; por sua vez, a nobreza e o clero reduziram as suas contribuições para o tesouro, que ficou mais depauperado. Luís XVI viu-se, então, perante o "levantamento da nobreza", obrigado a revogar as Leis de Maio e a convocar os Estados Gerais para Maio do ano seguinte. Contudo, o processo revolucionário era intravável. A dívida pública avolumava-se, o que provocou uma inflacção galopante. As condições meteorológicas também jogaram desfavoravelmente ao monarca, pois os Invernos de 1787 e de 1789 foram particularmente severos para as colheitas. A indústria estagnou, os motins tornaram-se frequentes. O golpe de Estado espreitava.

2 comentários:

  1. O povo tem fome, dá-lhe bolos lolololol

    O que aprendi hoje :)

    Abraço amigo

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    1. Crises sociais prolongadas acabam (quase) sempre assim...

      Ainda bem. :) Aprendeste tu e eu. Aprendemos sempre.

      um abraço, amigo, e obrigado pela atenção.

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